domingo, 20 de fevereiro de 2011

O lugar das drogas



Por: EVERTON PEREIRA

Em entrevista a Caros Amigos, a professora da USP Marilena Chauí respondeu ao ser perguntada sobre sua opinião em relação a legalização das drogas: “Se você não legalizar as drogas, você não acaba com o crime organizado”. Trata-se de uma resposta direta para um problema que deve ser encarado de maneira objetiva, com menos hipocrisia e mais pragmatismo pela sociedade e principalmente pelo poder público.

As drogas, para além de substâncias químicas, são também e talvez mais ainda, um fenômeno social, intrínseco a própria natureza humana. A utilização das mais variadas substâncias psicoativas se confunde com a história do homem na Terra. Queiramos nós ou não as drogas sempre existiram e sempre continuarão a existir. Sua extinção é algo que simplesmente não está no horizonte possível e sim desejável. Sob o discurso de se “acabar com as drogas” pode se esconder o desejo inversamente contrário que é o de se perpetuar não só o consumo e o comércio, mas também justificar a estrutura burocrática e bélica mantida sob a lógica da repressão e da criminalização do uso de drogas.

Assim como a questão também polêmica em torno do aborto, não se trata de ser contra ou a favor do fato em si. Defender a legalização do aborto não significa ser a favor que se realize um aborto. Da mesma sorte, ser favorável a legalização das drogas não é sinônimo de defender seu consumo, pelo contrário. Através da legalização pode-se focar mais no problema e dar a ele o lugar devido. A quem interessa fazer das drogas caso de polícia e não de saúde pública? Cerca de 70% da população carcerária brasileira - que é a terceira maior do mundo - está preza devido ao tráfico e consumo de drogas. Da mesma forma um percentual semelhante dos recursos da segurança pública são gastos no combate as drogas. A quem interessa manter esta estrutura? Será que a sociedade não paga muito caro, seja do ponto de vista tributário ou da violência, para se proibir que alguém consuma maconha, cocaína ou crack? Usar a educação e o sistema de saúde não seria uma estratégia mais eficiente e barata para combater as drogas? Por que o álcool, que pode causar mais prejuízo físico e social que muitas drogas ilícitas, pode ser comprado e comercializado a revelia? Estas são questões que devem ser discutidas de frente, despida do véu da hipocrisia, moralismo, ignorância e corporativismo.

O tráfico de drogas opera de maneira articulada com o tráfico internacional de armas. Manter as drogas ilícitas, sem controle estatal e cobrança de impostos, é antes de mais nada um interesse dos próprios cartéis. Quando o álcool foi proibido nos EUA através da Lei Seca em 1919 seu tráfico clandestino fez não só ampliar o consumo como também fez surgir a máfia norte-americana e toda uma organização criminosa em torno do álcool. Com o fim da Lei Seca em 1933, essa estrutura simplesmente desmoronou e a demanda por bebida voltou aos índices normais. Exemplos como este devem ser considerados também quando o assunto for drogas ilícitas.

O problema das drogas está posto. A forma como elas foram tratadas até aqui pouco ou nada adiantou. Solução definitiva não há, apenas redução de danos e um combate mais inteligente, visando sua minimização a patamares toleráveis. Tratar as diferentes drogas de maneira diferente também é necessário. O crack, por exemplo, é um fenômeno recente que necessita de ações imediatas. O trabalho deve ser no sentido de fazer com que menos jovens usem drogas e não no sentido de que mais pessoas sejam presas. Além de cara, a última alternativa gera uma série de efeitos colaterais que interessam a poucos e que só deixam ainda mais complexo algo que poderia ser enfrentado de maneira mais simples.

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