sexta-feira, 13 de agosto de 2010

“Retribuição Financeira”


Publicado no Butiá Notícias Edição 612 de 13 e 14 de agosto de 2010.

É característico dos regimes autoritários a utilização de siglas e nomes bonitos e pomposos para referir-se a ações inescrupulosas e imorais. Durante a ditadura militar iniciada em 1964 no Brasil, foi criado o Destacamento de Operações de Informações e o Centro de Operações de Defesa Interna, também conhecidos como DOI/CODI. Estas estruturas de Estado eram utilizadas para perseguir, torturar, seqüestrar e matar opositores do regime. Na Rússia stalinista, os opositores ao totalitarismo soviético eram tratados como “inimigos do povo” e enviados para campos de concentração na fria Sibéria. George Orwell em seu clássico 1984 denominou esta prática de novilíngua, que tem como função mascarar o real sentido das palavras para que os governos dominem totalmente a sociedade.

Em tempos de campanhas eleitorais e vitória a qualquer custo (literalmente), surgem eventualmente expressões que assemelham-se muito a novilínguas de Orwell. A mais recente que ouvi por candidatos e seus apoiadores é a chamada “retribuição financeira”. Vou tentar aqui ser o mais didático possível. O termo “retribuição” vem de “retribuir”, ou seja, dar algo em troca de um “favor” ou “trabalho” prestado. Para simplificar poderíamos chamar de pagamento. Já financeira, vem de finanças, dinheiro. Por hora poderíamos traduzir a tal da “retribuição financeira” por “pagamento em dinheiro” ou simplesmente “pagamento” ou mesmo “salário”. No contexto eleitoral e de campanha a “retribuição financeira” seria o pagamento em troca de apoio ou do voto, ou seja: compra de voto ou de apoio. Tudo o que nossa adolescente democracia menos precisa para sua evolução.

As estruturas de campanhas e mesmo de mandatos de deputados, senadores ou vereadores é lógico que exigem um certo grau de organização e estruturação. Para isso, é óbvio que devem existir assessores remunerados que dedicam todo seu tempo a estas funções. É realmente o trabalho destas pessoas. Mas ponto. No mais, “retribuir financeiramente” um eleitor ou mesmo um apoiador de ocasião não tem outro nome que não a compra de voto. Isto é crime. Crime não só eleitoral mais moral e até social. Quem vende o voto, está vendendo para os piores candidatos. Candidato bom não compra voto, conquista. Está condenando toda a sociedade a ser governada durante quatro anos pelos piores políticos, devido a força econômica das campanhas destes indivíduos que se valem de dinheiro e não de ideias para chegar ou manter-se no poder.

A melhor forma de um candidato pagar seus eleitores é com um bom mandato. Só os piores, aqueles que compram seus eleitores aparecem no Fantástico fazendo turismo às custas do povo. Os piores candidatos são eleitos por quem eles “retribuíram financeiramente” e por isso, são os piores eleitores também. Estamos vivendo um período propício para mudanças positivas. Devemos eleger os melhores, que são reconhecidos exatamente por não comprar voto. Mas caso você prefira trocar uma boa saúde ou uma escola de qualidade por uma dentadura ou um emprego temporário, tudo bem, só não reclame dos políticos que vocês mesmo elegeu depois.

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