sábado, 15 de maio de 2010

Raça, Cor e Fé



Publicado no Butiá Notícias, Edição 599, de 14 e 15 de maio de 2010.

Raça, Cor e Fé

O 13 de maio marca a história do Brasil por ter sido o marco oficial - ou oficioso - do fim da escravidão negra no país. Como todo evento histórico não é estanque em si próprio, por que é precedido por uma causa e naturalmente produz efeitos. Fomos o último país a abolir a escravidão. Não por bondade do Império, mas por pressões externas, principalmente inglesa e internas, dos negros que fugiam e rebelavam-se cada vez mais, dos abolicionistas e de parte dos fazendeiros que não tinham mais mão-de-obra disponível devido o fim do tráfico em 1850, que a escravidão teve fim.

A herança mais cruel dos 350 anos em que a escravidão foi legal no Brasil é o racismo. O racismo é produto de uma ideologia burguesa tanto cultural, como social e biológica. A “ciência” da época, deturpando o trabalho de Darwin, queria transpor para a sociedade a lógica biológica da evolução das espécies. Sugerindo que brancos fossem superiores aos negros. A classe dominante obviamente impunha para o conjunto da sociedade o seu mondo de vida, sua religião, como os únicos corretos e “mais evoluídos” e seu fenótipo também como o “oficial” e “belo”.

Fenótipo e genótipo são categorias biológicas em que o fenótipo (características externas de uma pessoa) é resultado da interação do genótipo (estrutura genética) com o meio. Logo, geneticamente somos todos absolutamente iguais no sentido de sermos todos da mesma “raça humana” e diferentes, apenas fenotipicamente. Em um lugar com pouco sol, como no norte da Europa, nossa pele teve que reduzir a melanina para absorvermos os nutrientes presentes nos parcos raios de sol. Na África, o problema é inverso, proteger-se do sol era o importante. Estudos já comprovaram que geneticamente pode haver mais semelhanças entre um negro e um branco do que entre dois brancos ou dois negros. O sistema de cotas nada mais é que o reconhecimento de que o racismo tem origem na discriminação a partir do fenótipo (aparência física) do indivíduo e não, uma relação direta com sua classe social, embora isso seja um agravante do problema.

O que podemos chamar de “modo de viver”, mentalidade ou cultura é talvez um dos traços mais positivos que a relação África Brasil produziu no último meio milênio como contribuição a sociedade brasileira. Sendo uma sociedade que não dividia o mundo religioso do mundo laico e da vida diária, a espiritualidade está impregnada na cultura tanto africana como afro-brasileira, mesmo que muitas vezes de forma inconsciente.

Diferente de outras etnias que formaram o Brasil, a africana talvez tenha sido a que mais se diferenciou e por isso mesmo, marcou tanto no imaginário e na formação cultural do povo brasileiro. Originária de uma cultura que poderíamos chamar de “festiva” a cultura afro-brasileira é em grande parte fruto de uma religiosidade com padrões de comportamento mais flexíveis do que o da cultura ocidental e cristã.

O homem é visto em sua plenitude. Com virtudes e defeitos. Assim como os deuses gregos, os orixás africanos possuem atributos tanto benevolentes, como
sentimentos “humanos” de ira, inveja, ciúmes e desejo. A linha maniqueísta entre o bem e o mal é relativizada. Não há uma noção exata de pecado e sim de ralação causa e efeito, “cármica”. A santidade está menos ligada a um modelo de perfeição moral do que a um arquétipo de personalidade vinculado com o orixá.

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